sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Aos que eu não tenho mais

Até pouco tempo atrás eu tinha um discurso pronto na língua. Dores e expressões que permeavam um senso comum de caixeiro viajante. Uma impressão obrigatória do que ficou depois do salto. E depois do tombo.
Era melhor antes, agora eu estava velha. Havia perdido o tom. Já era tarde e toda razão da minha insônia e do meu cansaço eterno encontrava-se escondida à meia-noite com a lógica insípida e entre agarramentos conspiravam loucuras.

Bastante confortável.

Então por que me deparo hoje com uma porta enorme no meio do caminho que faço todos os dias? Imenso vão surgindo naquela abertura desleixada. A sensação, chegando lá, é de que eu sempre fora míope sem saber. E então acontece aquele flash e tudo vai se repetindo devagar com a certeza novata insistindo que agora as falhas iriam se preencher fechando o mosaico e trazendo um pouco de sentido... Ou tirando bastante do óbvio.
Pois agora, um pouco aliviada nos ombros, estou tentando juntar umas palavras que se traduzam em leituras sem vício. É aquela esperança boba de alcançar o bolo que está em cima da geladeira.

E eu que sempre pensei que a consciência fosse libertadora, hoje percebo que é uma reles condicional.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Idéia imediata

Quem diria que eu me encontraria hoje nesse corpo mirrado de fala resmungada e mente no repeat.

Assim estou. Sentado, sentindo e transpondo toda a minha velhice desde que desisti de caminhar para guardar as gotas de energia que a vida me dava em pingos miseráveis semanais... Os olhos parecendo não ver, talvez em protesto pela cegueira de uma geração.
Acomodo-me entre as tábuas com meus ossos que perderam a proteção e agora esperam a ordem para desmoronar. Mas eu não me importo porque não dói. Pelo contrário, sinto conforto na rigidez insegura da minha estrutura oca e faço pirraça me encurvando um pouco mais. Olho para os pombos com fome e para a mulher gorda que finge sofisticação. Se fosse para comer talvez ela fosse mais apetitosa, mas a questão toda é que eu prefiro os bichos mesmo.
Passa o jovem atlético correndo descompassado: é seu pescoço que virou para acompanhar o ritmo daquela colegial com quadris de criança. Meu ouvido peludo capta um choro de bebê que mais se assemelha a uma gata no cio e assim desperta minha fome novamente.

Talvez devesse tomar um café da manhã de vez em quando...

O fato é que não lembro de estar em outro lugar que não nesta praça de 5 metros de diâmetro em frente a uma igreja meio caipira que mais recebe famintos em busca de hóstia do que fiéis em busca de uma carreira de reza. E nessa onda de ficar sempre aqui esqueço a hora de ir.

Foi quando me deparei comigo de pé em um dia de garoa com sol porque não encontrava o banco. E nem a praça. Nem mesmo aquele cheiro agridoce de feijão com detergente da velha de muletas. Foi aí que lembrei de voltar.

Mas agora não me pergunte mais. Não lembro bem se voltei ou não.